Longas raízes, conexões profundas
Essas duas histórias se passam na savana mais biodiversa do mundo, e um dos hotspots globais de biodiversidade. Comunidades como as de Dona Lúcia e das mulheres Kalunga podem ser encontradas por todo o Cerrado, região no centro do Brasil que é maior do que França, Itália, Portugal e Espanha juntos.
Nele, encontramos uma variedade de paisagens, fauna, flora e povos. A biodiversidade do Cerrado têm enorme potencial alimentar, medicinal, para construção de casas, fibras para artesanato, dentre outros. São cerca de 199 espécies de mamíferos, 864 de aves, 180 répteis, 210 anfíbios e 1.200 peixes. Ele também abriga mais de 12 mil espécies de plantas vasculares, das quais mais de 4 mil só podem ser encontradas em suas paisagens, é o que chamamos de espécies endêmicas.
Apesar de grande parte da sua vegetação ser composta por gramíneas, ervas, arbustos e árvores de médio porte, embaixo do solo é onde tudo acontece: com raízes que ultrapassam 10 metros de profundidade, representando até 75% da biomassa de arbustos e árvores, o Cerrado consegue estocar cerca de 13,7 bilhões de toneladas de Carbono.
A savana brasileira atua como um importante acumulador e assimilador de Carbono, contribuindo significativamente para seu ciclo na atmosfera, e sendo importante protagonista para deter uma das consequências do desequilíbrio climático: o aquecimento global. É uma floresta invertida que ajuda a equilibrar o clima do planeta.
Se o assunto é água potável, o Cerrado ganha ainda mais protagonismo. Apesar de ser uma região com estação seca bem marcada, ela é abundante em nascentes de água cristalina, rios, riachos e veredas. Nele, encontram-se afluentes importantes das três maiores bacias hidrográficas da América do Sul e que abastecem com água potável quase metade da população brasileira e ainda alcançam a Bolívia, Paraguai, Argentina e Uruguai. Isso porque sua vegetação contribui para a captação das águas das chuvas que abastecem o segundo maior reservatório subterrâneo de água no mundo, o Aquífero Guarani, que possui 1,2 milhão de km².
Encontrados apenas no Cerrado, dois aquíferos de importância nacional, o Bambuí e Urucuia, ampliam a importância do Bioma para o acesso à água potável. Os dois são fundamentais para o abastecimento de toda a bacia do São Francisco, rio da integração nacional que abastece grande parte do Semiárido, região do nordeste brasileiro com uma das maiores taxas de desigualdade social do país e com problemas históricos relacionados ao acesso à água. Os aquíferos Bambuí e Urucuia ainda garantem o abastecimento de importantes rios dos estados de Minas Gerais (sudeste brasileiro), Bahia (nordeste brasileiro) e Tocantins (norte brasileiro). Em períodos de longas secas, significa vida para as populações locais.
Com toda esta riqueza de água, o Cerrado está diretamente relacionado com a segurança energética. No Brasil, 80% da eletricidade vem das usinas hidrelétricas, muitas das quais estão localizadas em rios como Tocantins, São Francisco e Xingu, que possuem suas fontes na floresta invertida.
Som das águas: